O PESO DE UMA AVENIDA E DE UM NOME

Fato marcante na Vila Operária é o grande número de ferros-velhos (sucatas), compostos por papéis, garrafas, metais etc., num comércio intenso de compra, venda e troca. Esse tipo de negócio fomentou o surgimento de atividades econômicas como, por exemplo, a de catadores de papel, de garrafas e de metais, que transportam essa tralha em carroças puxadas por animais ou mesmo em carrocinhas de madeira tracionadas pela força humana. Essa fonte geradora de empregos é responsável por uma parcela razoável de trabalhadores que diariamente visitam os moradores do bairro e de outros pontos da cidade em busca de produtos e materiais desprezados pelas pessoas, mas que dentro de um processo reciclador ou de reutilização ainda têm seu valor.

Com o advento dos condomínios residenciais verticais (anos 1980:, o contato entre o recolhedor de sucata e o morador ficou muito distante, mediado peto interfone do prédio, que evita a proximidade entre as partes, ao contrário das casas, onde o relacionamento ocorre no patamar da calçada e a transação pode transcorrer de forma mais livre. A maior parte dos depósitos de ferros- velhos situa-se na Avenida Mauá, uma via que desde o início dos anos 1950 abriga fábricas oficinas mecânicas, metalúrgicas, fundições enfim várias empresas que têm no metal sua matéria-prima principal, dando a essa avenica um “status” industrial. Por essa razão, o tráfego de carga pesada é uma constante,, estando a Mauá articulada em suas extremidades com as arterias Pedro Taques e Tuiuti, corredores que desembocam na Avenida Colombo. Um movimento que transformo o vida dos que residem nela em verdadeiro transtorno, seja por causa do perigo que representa o frenético fluxo de carros e caminhões, seja mesmo pelo barulho provovados pelos veículos e empresas.

Por essas e outras razões de ordem técnico-urbanística, a Mauá atravessa um momento de metamorfose no que tange à sua vocação originai. A partir de meados dos anos 1980, iniciou-se a construção de vários edifícios residenciais, como de resto em todo o bairro, o que resultou num aumento considerável da população da avenida. Como conseqüência mais imediata, começaram as queixas das pessoas em relação aos ruídos excessivos, fumaça expelida pelas chaminés das fábricas, mau cheiro provocado pelos produtos industrializados nas imediações, e principalmente em relação ao risco de atropelamento causado pelo trânsito intenso. Várias empresas estão abandonando o antigo endereço e mudando para regiões afastadas da área central da cidade, dispondo de maior espaço e possibilitando futuras ampliações.

Quando apontamos “vocação original”, queremos dizer que essa parte da vila teve um destino predeterminado dentro do quadro geral denominado Plano Urbanístico de Maringá, ficando todos os 8 bairros primordiais com suas atribuições específicas. Cabia à Operária o estabelecimento de moradias nas ruas e de comércio nas avenidas, somente sendo permitida a fixação de indústrias em um dos lados da avenida Mauá. Os terrenos têm até uma dimensão maior do que os demais, fugindo ao padrão, algo em torno de 1.200m2, o dobro dos outros, revelando nessa medida a intenção clara de se criar um pólo industrial na Vila Operária. Só para reforçar essa assertiva, lembramos a localização dos fundos dos lotes, que dão para a estrada de ferro, facilitando o escoamento dos produtos através d o transporte ferroviário.

A Avenida Mauá estende- se por 2.000 metros (2km), divididos em 13 quadras (quarteirões) e ao longo de sua existência viu empresas das mais diversas naturezas alocar-se nela, bem como pessoas procedentes de regiões muito diferentes entre si. Com base em depoimentos orais de pioneiros, as primeiras firmas a aportarem nessa via (fins dos anos 1940) foram serrarias, máquinas de café, fábricas de conserva de palmito, entre outras, numa límpida demonstração de que os produtos primários, como café, madeira e palmito (abundante no início da colonização), tinham a hegemonia da ocupação do espaço urbano dedicado à indústria de transformação. Apesar desse caráter agroindustrial, em princípios dos anos 1950 observa-se a instalação, na Avenida Mauá, de alguns estabelecimentos do setor metal-mecânico, que num futuro bem próximo se revelará a tendência hegemônica.

Andar pela Avenida Mauá é sentir no corpo uma mistura de tensão e temor, já que em pleno centro de Maringá um pequeno parque industrial insiste em permanecer incrustado no mapa. A tendência moderna do urbanismo em relação às cidades de porte médio é desalojar das áreas centrais as fábricas de outrora, pois a função seminal da urbe é hospedar os seres humanos em espaços residenciais. Acontece o seguinte: nadando contra a corrente, diversas indústrias, numa cidade obcecada pelo comércio e agricultura, mantêm-se inarredáveis num ponto cobiçado por muitos incorporadores. Já nos anos 1950, a Operaria sentia orgulho em ser o teatro de operações de pelo menos 6 centros produtores de refrigerantes, marcas que entravam nos lares maringaerses diariamente, ganhando dinheiro e simultaneamente veiculando o nome da Vila Operária. Descofia-se que o rótulo da garrafa foi o primeiro mecanismo de propaganda em massa com que o bairro contou em Maringá.

A última empresa de bebidas remanescente dos anos 1950 está deixando a vila nos dias atuais e com ela um período efervescente, mas que abre uma nova fase histórica, que aliás principiou nos anos 1980, quando inclusive o nome de Vila Operária correu o sério risco de ser extinto. Na segunda metade da década de 1980, um grupo de moradores propôs a troca da epígrafe Vila Operária por Vila São José, iniciativa que angariou antipatia e foi rechaçada imediatamente pela maioria esmagadora do povo do bairro. Desvendar as razões que levaram alguns a desejar mudar o nome da vila pode não ser missão impossível; basta fazer a soma dos fatores: preconceito contra o trabalhador mais ganância em auferir lucros. Os entusiastas dessa idéia acreditavam piamente que a palavra “Operária” prejudicaria os investimentos futuros dos empresários do ramo imobiliário, negando a inteligência do empreendedor e do consumidor de bens, que não teriam óbice algum em marquetizar (vem de “marketing”) e vender a “Operária”. E foi o que acabou acontecendo: hoje os edifícios brotam da noite para o dia e o nome do bairro conserva- se tão firme quanto antes, numa convivência harmoniosa entre progresso e tradição (ainda que uma moderna tradição). Esse movimento malfadado tentava esterilizar a vila, extirpando das gerações atuais e subseqüentes (pois cada vez que se pronuncia um nome evoca-se o seu sentido de origem) a figura histórica do trabalhador,ppeça fundamental na engrenagem de criação e manutenção da sociedade do trabalho no bairro.

Para os que defenderam de maneira obstinada a preservação do epíteto da vila, fica a impressão de que emergiu nesse ato um sentimento de respeito e afeto não somente à história do bairro, mas principalmente à sua própria história de vida, de um sujeito que suou demais para perder sua identificação de forma tão leviana. A recusa popular dessa alteração nominal mostrou acima de tudo que os poderes público e privado já atendiam à vontade da população; prova disso são os ônibus de transporte coletivo que transitam pelo interior do bairro e as placas de sinalização que indicam a localização da vila. Eles trazem a denominação “Vila Operária’ Nem mesmo o termo “Zona 03” foi recuperado ainda que tecnicamente esta seja a designação empregada.

 

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fonte:  

Memória dos Bairros –  Vila Operaria 

Prefeitura do Municipio de Maringá

Secretaria da Cultura 

Gerência de Patrimônio Histórico